“Palo Santo” vê o Years & Years revisitar a estética musical e lírica de sua estreia e atualizá-la com confiança.
Quando o Years & Years lançou seu primeiro álbum de estúdio suas vidas mudaram completamente. Esse disco os lançou simultaneamente em águas internacionais e os transformou em estrelas no Reino Unido. Isso criou especialmente uma faísca na comunidade LGBTQ+, com o quão aberto o líder Olly Alexander era sobre sua sexualidade. Composto principalmente por Alexander nos vocais, Mikey Goldsworthy nos teclados e baixo, e Emre Türkmen nos sintetizadores e guitarra, Years & Years é um trio compacto e extremamente talentoso. Enquanto têm membros que viajam com eles em turnê e são uma parte imperativa de seus shows ao vivo, todo o resto é executado pelos três. Produzido pela banda, o “Palo Santo” é o segundo álbum de estúdio do Years & Years. Influenciado pela religião e espiritualidade, Olly Alexander queria conectar a transcendência religiosa à música pop. O título é uma referência para a árvore sul-americana “palo santo”, que era usada para afastar os maus espíritos. “Palo Santo” é um registro conceitual, ambientado no mundo fictício de Palo Santo, onde as regras tradicionais sobre gênero e sexualidade não existem. Seu conteúdo lírico aborda a conexão entre religião e carnalidade, usando a religiosidade para lidar com temas de sexualidade, estranheza e culpa.
Seu visual é inspirado pela ficção científica e a tecnologia, onde androides sonham em sentir emoção. Musicalmente, é um álbum de dance-pop e electropop fortemente influenciado pelo R&B dos anos 90. Alexander explicou que Palo Santo é uma sociedade distópica sem gênero, dirigida por androides fascinados por seres humanos, e que as fortes imagens religiosas podem ser vistas como paralelas ao tema de sexualidade. Enquanto a definição de sexualidade está sendo examinada mais do que nunca, poucos artistas a representam tão bem quanto o Years & Years. Apesar das alusões do “Communion” (2015) à sexualidade do Olly Alexander, desta vez não há restrições no “Palo Santo”. Desde o lançamento do seu disco de estreia, o cantor promoveu iniciativas anti-bullying à comunidade LGBTQ+ e apresentou um documentário na BBC – onde destacou a relação entre ser gay e o desenvolvimento de distúrbios mentais. Com instrumentais mais contemporâneos, “Palo Santo” é um álbum que se torna mais contagiante a cada nova escuta. Ele tem o mesmo charme do “Communion” (2015), além de momentos vulneráveis que ecoam sobre uma melancolia eletrônica.
A sexualidade do Alexander é apresentada sem qualquer remorso, e parece mais poderosa quando colocada a frente de imagens religiosas. Muitas vezes falando abertamente sobre ser gay, bem como suas lutas com a saúde mental, “Palo Santo” não o vê se escondendo atrás de metáforas ou expressões. Cada música tem seu lugar de direito e apresenta algum elemento diferente. Enquanto Alexander nunca escondeu sua homossexualidade, ele é mais explícito ao falar sobre assuntos com caras heterossexuais e mostrar maior vulnerabilidade sexual. Em termos de produção, Years & Years se atreve a dar passos mais adiante do que em sua estreia. Eu não estou exagerando quando digo que cada refrão é digno de se tornar um hit radio-friendly. “Palo Santo” coloca Olly Alexander como o protagonista do LP – seus esforços românticos, tanto os relacionamentos quanto as conexões casuais, são desprotegidos e estão em plena exibição. Outro aspecto proeminente do álbum é sua conexão com a religião e fé. O primeiro single, “Sanctify”, começa com uma linha de baixo e algumas batidas esqueléticas. Não demora muito para a música trazer o primeiro álbum do trio à mente.
A canção não parece longe de qualquer coisa que escutamos no seu disco de estreia. Certamente, “Sanctify” é uma progressão natural do som apresentado no “Communion” (2015), embora seja um pouco mais sombrio. O synth-pop cativante marca presença, mas as batidas estão mais inclinadas para o dark-pop. Eles evitaram a música moderna em favor de algo mais nostálgico e pesado. O arranjo de R&B nos remete ao final da década de 90 e começo dos anos 2000. Produzida por Kid Harpoon, é uma canção inspirada por Justin Timberlake, Britney Spears e Christina Aguilera. “Então não quebre / Santifique meu corpo com dor / Santifique o amor que você anseia / Ah, e não vou, e não vou, e não vou me envergonhar / Perdoai meus pecados quando eu rezar”, Alexander canta no infeccioso refrão. Embora não seja uma canção instantaneamente cativante como “King” ou “Shine”, é um single maravilhoso que se manteve fiel ao som do Years & Years. “Hallelujah”, por sua vez, apresenta um ritmo doentio e elegante trabalho de produção. Assim como a faixa anterior, um senso de espiritualidade é referenciado no título, mesmo que as letras sejam estritamente sexuais.
Gerada pelo talento do Greg Kurstin, a energética “All for You” mantém o ritmo relativamente rápido e elementar. Embora seja sonoramente brilhante, Olly Alexander aborda o fim de um relacionamento. Durante a ponte, ele é honesto sobre seus arrependimentos, enquanto algumas linhas – “E o amor é um fruto amargo se você escolher permanecer na sua vergonha” – fazem referência ao romance de Adão e Eva. Em seguida, “Karma” recria perfeitamente o pop e R&B do final dos anos 90. Vocalmente, Alexander continua impressionando, particularmente quando sobe para o falsete. Da mesma forma, sua atitude continua liricamente madura: “Inimigos estão tentando alcançar / Mas nada vai foder com meu amor”. A raiva ecoa em quase todas as músicas do álbum, mas nunca tão forte quanto em “Karma”. Ademais, os deliciosos sintetizadores são elementos essenciais da produção. A velocidade diminui na linda balada “Hypnotised”, onde a paixão cresce até o último grau. “Rodeie-me, corpo e alma / Puxe-me em seu brilho, faça-me corar”, Alexander canta. A faixa lida com o estágio inicial de um novo relacionamento e encontra o vocalista concluindo que seu “coração foi hipnotizado”.
A música tem uma semelhança vívida com o título, pois de fato possui a capacidade de hipnotizar o ouvinte com sua calmaria e suavidade. “Rendezvous” pega o ritmo de volta, onde o estado do relacionamento é sexual e não emocional. Isso é confirmado por letras fisicamente dirigidas, tais como: “Eu não quero ser algo objetificado”. É uma das faixas mais experimentais do repertório; com graves profundos e incríveis sintetizadores. O segundo single, “If You’re Over Me”, apresenta um trabalho de produção exuberante e inspirado no bubblegum-pop. Aparentemente, Olly Alexander está no piloto automático – como podemos notar nos vocais relativamente descontraídos. Embora brilhante e borbulhante, tematicamente ele canta sobre um relacionamento em que seu ex-namorado não parecia feliz. “Você diz a todos que nosso amor esfriou”, ele canta no pré-refrão. “Se é assim que você se sente, então você deveria ir embora / Não venha dizer: eu ainda quero você”. É uma canção que fornece a irritação que vem com um ex-namorado(a) que simplesmente não te deixa em paz. É o tipo de música que você vai se sentir atraído, mesmo que nunca tenha passado por tal situação. Embora seja uma faixa sonoramente otimista, aborda um relacionamento que não deu certo.
“Preacher” se destaca graças à natureza social, sexual e espiritual de suas letras. Aqui, Alexander exorta seu interesse amoroso a viver sua verdade em vez de mentir sobre sua sexualidade. A mistura conflitante de raiva e alívio em “Lucky Escape” é particularmente magistral. Dessa vez, o cantor reflete sobre um relacionamento doentio e o novo amor de seu ex-namorado. Escrita exclusivamente por Alexander, é uma balada cercada por sentimentos efervescentes. Envolvida por influências de soul e R&B, é para aqueles que querem se sentir fortalecidos pela decisão de terminar um namoro que não estava dando certo. A breve “Here” conclui a edição padrão do álbum, enquanto Alexander pede que seu ex-namorado o esqueça. Mais uma vez, os vocais permanecem na vanguarda. É uma conclusão apropriada para o álbum, pois combina o tema religioso com um lirismo pensativo. Este álbum é bem sucedido por uma infinidade de razões. Em primeiro lugar, Olly Alexander é um vocalista convincente com um conjunto vocal bastante intrigante. Além disso, a produção e a composição são muito boas, tornando este disco incrivelmente consistente do início ao fim. É o tipo de álbum que a comunidade LGBTQ+ precisa. Devemos ser gratos ao Years & Years por entregá-lo na hora certa – em um mundo que continua destilando ódio e opressão.